Bahia lança plano para reduzir em 10% a letalidade policial após liderar mortes por ações da PM no país

Da redação

Após dois anos consecutivos liderando o ranking nacional de mortes decorrentes de ações policiais, o governo da Bahia anunciou, nesta quarta-feira (22), um plano de metas para reduzir em até 10% a letalidade policial no estado. A medida foi elaborada pela Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA) em resposta a dados alarmantes: entre 2021 e 2024, 6.078 pessoas morreram em operações das forças de segurança baianas.

Segundo informações do Correio, o documento reconhece a existência de uma “cultura do confronto” nas polícias, marcada por abordagens reativas e pouca ênfase na mediação de conflitos. Essa dinâmica, segundo o texto, tem resultado em altos índices de mortes em intervenções policiais, vitimização de agentes e crescimento da desconfiança das comunidades em relação às forças de segurança.

Baixa elucidação e fragilidade nas investigações

Outro ponto crítico destacado pela SSP-BA é a lentidão e a falta de transparência nas investigações. Em 2024, apenas 23,4% dos inquéritos sobre mortes em ações policiais foram concluídos, conforme dados da Corregedoria-Geral do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Coger). Do total de 1.251 inquéritos abertos, 295 chegaram ao fim.

Além disso, a baixa integração entre inteligência e operações foi apontada como um fator que fragiliza o planejamento e aumenta os confrontos armados. Segundo levantamento da Coger, mais de 40% dos tiroteios registrados em 2023 ocorreram durante rondas de rotina não comunicadas previamente pelos Centros Integrados de Comunicação (CICOMs).

Medidas propostas

Entre as ações previstas para reduzir o uso excessivo da força, o plano propõe:

• Revisão e modernização da formação policial, com foco em mediação de conflitos e uso diferenciado da força;
• Implementação de protocolos operacionais específicos e uso de armas de menor potencial ofensivo;
• Ampliação do uso de câmeras corporais, com meta de atingir 30% de registros até 2026 — hoje, apenas 7,5% das 1.300 câmeras adquiridas estão em uso;
• Criação de protocolos especiais para operações em áreas sensíveis, como escolas e hospitais, devido à alta incidência de tiroteios próximos a unidades públicas de ensino;
• Capacitação de 30% do efetivo policial até 2026 no uso diferenciado da força;
• Apoio psicológico obrigatório a 100% dos profissionais envolvidos em confrontos letais.
• O plano também prevê aumento da taxa de resolutividade dos inquéritos de 50% em 2026 para 70% em 2027.

Perfil das vítimas

De janeiro a junho de 2025, 841 pessoas já foram mortas em ações policiais na Bahia — mais da metade do total de 1.556 mortes registradas em 2024. A maioria das vítimas é jovem (41,1% entre 18 e 24 anos), negra (94%) e com baixo nível de escolaridade — apenas 17,1% concluíram o ensino médio.

Dez municípios concentram 51% das mortes, com Salvador liderando (247 casos, 29% do total), seguida de Eunápolis, Porto Seguro, Lauro de Freitas e Juazeiro.

A análise da dinâmica das ocorrências mostra que a quinta-feira é o dia mais letal, com 158 mortes registradas, seguida de sexta (149) e quarta-feira (129). O período da tarde concentra 36,1% dos casos, com pico entre 16h e 17h.

As regiões mais afetadas são o Recôncavo (116 mortes), a Baía de Todos os Santos (90) e o Extremo Sul (89) — nenhuma dessas áreas utiliza câmeras corporais nas operações.

Contexto nacional

O pico de mortes por intervenção policial na Bahia ocorreu em 2023, quando 1.702 pessoas morreram em confrontos — 199 apenas em agosto. No mesmo ano, o estado liderou o ranking nacional de impunidade em homicídios dolosos, com apenas 13% dos casos esclarecidos, segundo o Instituto Sou da Paz.

A SSP-BA afirma que as novas diretrizes terão acompanhamento contínuo e que a integração entre polícia, Ministério Público, Judiciário e perícia será prioridade. O plano também vincula os índices de letalidade aos critérios de premiação e progressão das forças de segurança, numa tentativa de incentivar a valorização da vida e a redução do confronto armado.