Que delícia de Natal! – por José Pacheco Maia Filho
José Pacheco Maia Filho
Tem gente que acha o Natal triste. Pois é…não tem forró, pagode, axé, sertanejo, frevo etc. É “jingle bell, jingle bell”, “eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel”, “noite feliz, noite feliz”… Não são lá músicas pro “regue”. Eu nunca estive muito aí para a trilha sonora natalina.
Desde a minha infância, na casa de meus pais, o apelo era gastronômico. No São João, a mesa também era farta de delícias. Mas o dia 24 de dezembro, tinha todo um ritual lá em casa. A porta era aberta. A celebração natalina não se restringia à nossa família; pais e filhos. Dela participava quem aparecesse. E sempre havia primos, tias, amigos e agregados.
Há pouco comi um delicioso peru. Eram 19:30. Na casa de minha mãe, a ceia só era servida à meia-noite. Era o único dia do ano em que meu pai dormia tarde. Não era por causa do maravilhoso peru assado, acompanhado de uma farofinha sensacional, salada e arroz, além de um presunto maravilhoso, temperado com mel por minha mamãe, não.
Meu pai ficava acordado até mais tarde por causa da Missa do Galo, transmitida pela tevê. Era um católico praticante de verdade. E olha que ele, no mínimo, ia uma vez por semana à igreja, onde cumpria todo o ritual religioso. Dr. Pacheco era uma figura. Acabava a Missa do Galo, ele comia uma coisinha – era todo disciplinado na alimentação – e ia dormir.
A gente ficava curtindo madrugada adentro, beliscando uma uvinha, uma passinha, uma ameixinha, um bombocado, um pãozinho com peru e queijo de cuia ou presunto, além de uma torta de nozes deliciosa que minha mãe fazia. Fico aqui babando só de lembrar. Por falar em babar, havia também uma baba-de-moça para acompanhar um bolo ancestral, chamado mãe benta. O “bolo de duzentos anos”. Era uma receita da avó dela. Desmanchava na boca.
Uma cena hilariante e inesquecível foi o porre em que ficou Nikimba, um amigo de infância, depois que bebeu uma taça de champagne. Brindamos todos o nascimento do Menino Jesus. Éramos eu, Francisco (meu irmão), Adriano (amigo), Gajé (amigo) e Nikimba, que nunca tinha experimentado o espumante da França. Pra quê? Não bateu bem. Nikimba ficou bebum, pisando em cobras e dando chute nas paredes.
Por falar em bebum, esta ceia lá em casa era desde o tempo que se comprava o peru vivo. Que onda… O bicho chegava da feira e ficava preso na varanda até o dia de seu trágico destino. A sua hora era precedida por uma boa dose de cachaça. Ao contrário da música “eu bebo sim, estou vivendo”, o bípede com plumas morreria. Bebum, o peru perdia as forças para reagir à degola. Tinha muito carrasco que chorava depois de passar o facão no pescoço da ave embriagada.
O progresso acabou com esse sentimento de culpa. O peru congelado Sadia chegou para eliminar este drama na consciência. O bichinho já vinha até com apito para avisar quando estava no ponto para deixar o forno. Lembranças, muitas lembranças, que ficam para outras oportunidades. Preciso ir agora para o segundo tempo de hoje, a ceia na casa de minhas filhas. Feliz Natal!