sábado, 8 de novembro de 2025

Quase esqueci de falar da Odete

Foto: Reprodução/TV Globo

Davi Lemos

Ainda bem que a memória do original será perpétua. Não recordo exatamente se aquela disciplina com o saudoso professor André Setaro foi em um semestre de 1999 ou 2000, mas ele desejava que assistíssemos às obras exibidas naquele período com olhar atento: fotografia, enquadramento de câmera e, importantíssimo, assistir aos filmes no idioma original; nada de dublagem, aquilo era sacrilégio.

Numa semana, assistimos a Psicose, clássico de Alfred Hitchcock. Como já não éramos calouros, naquela disciplina de crítica cinematográfica fomos convidados a analisar o mais famoso filme de suspense da história. Chamou-me a atenção ter lido, antes de assistir ao filme, como tantos chegaram a passar mal durante a primeira exibição, em 1960, a sair das salas de cinema aterrorizados. Quase 40 anos depois, Psicose já não assustava, mas observar a forma como foi filmado, os detalhes, a sutileza; tudo isso era marcante.

Justamente isso, a sutileza, é que não esteve presente na versão de Psicose lançada em 1998, por Gus Van Sant. Também escrevemos uma crítica à versão e recordo que me chamou a atenção uma cena em que Norman Bates, ao observar Marion Crane por uma fresta, masturba-se. Em Hitchcock, a cena faz intuir o ato sem grandes gestos do ator; mas o Bates de Van Sant balança-se com nenhuma sutileza.

Sim. Mas por que estou falando de Psicose? Nas últimas semanas, o Brasil parou, dizem, para acompanhar o final de Vale Tudo e saber quem matou Odete Roitman. Vimos que Odete não morreu, mas o desfecho, segundo os poucos instantes em que prestei atenção ao capítulo final, foi tão “non sense” que fez cair no ridículo uma trama aclamada na década de 1980.

Odete tomou um tiro, pareceu morta, foi socorrida por profissionais que não conseguiram identificar que ela estava viva e, para surpresa de alguns e vergonha de muito outros, surge viva como se fosse o Jason (de Sexta-feira 13) para cometer maiores maldades. Faltou sutileza à autora do remake, Manuela Dias, ao querer inovar sobre a obra original de Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères.

O remake de Vale Tudo conseguiu superar o horror daquela refilmagem, quadro a quadro, de Psicose. E, lembrando de Bates, quase esqueci de Odete. Mas que bom que a memória dos clássicos permanece.

Davi Lemos é jornalista

21 de outubro de 2025, 17:56

Compartilhe: